O que as convenções indicam sobre futuro da eleição a presidente
As convenções partidárias para escolha dos candidatos nas eleições foram finalizadas nesta sexta-feira (5) e deixaram sinais de como será a campanha presidencial deste ano: polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e fragilidade da terceira via. Há, ainda, uma sinalização de que o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estarão no centro das discussões eleitorais. Por fim, as convenções também indicaram quais serão as estratégias e o discurso dos principais concorrentes nos próximos 60 dias de campanha.
A convenção do PL, que oficializou a candidatura de Bolsonaro à reeleição, foi realizada no ginásio do Maracanãzinho, no Rio de Janeiro, e contou com a presença de milhares de apoiadores. O partido tinha um objetivo claro: mostrar em imagens a popularidade de Bolsonaro – algo que deve ser usado na campanha.
O evento foi marcado por críticas de Bolsonaro a Lula, à esquerda e ao STF – com direito a convocação de seus apoiadores para irem às ruas no dia 7 de setembro.
O discurso de Bolsonaro indica que ele vai reeditar, em 2022, o temor da “ameaça comunista” representada por uma possível volta do PT ao governo. Durante a convenção, ele disse que sua vida não foi fácil após ser eleito, mas declarou que o conforta “não ver sentado naquela minha cadeira um comunista”. Bolsonaro disse também que segue uma rotina de orações em que reza para que o “povo” nunca “experimente as dores do comunismo”.
Referências à religião e a defesa do conservadorismo, por sinal, devem ser outra marca da campanha do presidente. O discurso da primeira-dama Michelle Bolsonaro na convenção foi marcado por várias referências religiosas. Michelle deve participar ativamente da campanha para conquistar o voto de mulheres.
Na convenção, Bolsonaro buscou associar Lula com a agenda progressista e lembrou dos casos de corrupção nos governos do PT. O presidente buscou ainda diferenciar sua gestão, afirmando que não houve desvios ou má conduta em seu governo. “Se aparecer, vamos colaborar nas investigações”, declarou.
Mesmo com um discurso mais crítico, Bolsonaro aproveitou a convenção para apresentar as realizações de seu governo e que vão estar na sua propaganda eleitoral. E fez afagos a aliados do Centrão, uma sinalização de que ele aposta nos partidos que compõem sua base de sustentação como cabos eleitorais.
O deputado federal Bibo Nunes (RS), vice-líder do PL na Câmara, diz que as falas de Bolsonaro dão o tom da campanha, em que as discussões vão se concentrar nos feitos do seu governo e em Lula. “A convenção mostrou um presidente empolgado, animando a militância toda com um discurso propositivo de verdade. É Lula e Bolsonaro; e não tem condições de ninguém ir contra ou fazer uma terceira via”, analisa.
Quais são os sinais da convenção do PT que oficializou Lula
A convenção que oficializou a candidatura de Lula foi marcada por uma grande ausência: a do próprio ex-presidente. Mas isso foi proposital: o PT trabalha nos bastidores para que a eleição seja decidida no primeiro turno, e isso passa por fechar o maior número de alianças possíveis, tentando atrair inclusive partidos de outras correntes políticas que tinham pré-candidatos.
Essa estratégia tende a ser usada no discurso eleitoral como uma mostra de que Lula é o líder de uma frente ampla que defende a democracia em contraposição a Bolsonaro.
No mesmo dia da convenção do PT, o ex-presidente estava em Pernambuco, onde trabalhou para fechar a montagem de seu palanque no estado. Lula usou o período das convenções em articulações regionais para aparar arestas restantes e selar acordos estaduais que lhe garantam mais apoios.
O deputado federal Zé Neto (BA), vice-líder do PT na Câmara, diz que Lula acertou ao cuidar dos palanques estaduais. Segundo ele, as agendas estavam “apertadas” e era preciso dar atenção especial a alguns estados. “A eleição do PT é a eleição de um campo do país, não só de um partido. E essa aliança que compomos é muito mais consistente do que a de 2002. Há 20 anos, não tínhamos o risco que temos hoje de manter em xeque a nossa democracia”, afirma.
A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), logo após a convenção que oficializou a candidatura de Lula, confirmou que a ideia do partido era fechar uma coligação ampla. A aposta foi fazer acenos a potenciais aliados de outras correntes políticas – o que se encaixa na estratégia de conquistar o maior número de eleitores, não apenas de esquerda.
Após isso, o PT conseguiu o apoio de André Janones (Avante), que desistiu de sua candidatura a presidente. E, em meio a uma disputa judicial pelo comando do Pros, conseguiu o apoio do partido. Nesse período de convenções, o PT também tentou uma frustrada aliança com o União Brasil. E uma ala do MDB tentou impedir a candidatura de Simone Tebet (MDB-MS) para apoiar o PT, mas ela acabou sendo oficializada como candidata.
A entrevista coletiva de Gleisi para falar sobre a convenção também deu indicativos de alguns pontos que serão usados na campanha para criticar Bolsonaro: inflação alta, renda em queda, fome e “discurso de ódio” devem ser assuntos centrais da campanha de Lula.
E o que as convenções mostram sobre a terceira via?
O período das convenções partidárias também mostrou a fragilidade dos nomes da terceira via para romper a polarização entre Lula e Bolsonaro.
Dois pré-candidatos desistiram. André Janones (Avante-MG) decidiu apoiar Lula e Luciano Bivar (União Brasil-PE) abriu mão da disputa ao Planalto para concorrer à reeleição na Câmara – o partido então lançou a senadora Soraya Thronicke (MS), que está no meio do mandato de oito anos e não corre risco de ficar sem uma cadeira no Congresso.
Além disso, grande parte dos nomes da terceira via oficializaram a candidatura sem ter escolhido um vice. Eles esperaram até onde puderam para tentar oferecer a vaga a algum partido que os apoiasse.
O ex-governador cearense Ciro Gomes (PDT) foi um dos que esperou até a última hora para definir o vice – a confirmação veio só nesta sexta, com a escolha de Ana Paula Matos, vice-prefeita de Salvador. Na convenção que oficializou sua candidatura, ele também indicou qual deve ser o tom de sua campanha: criticou tanto Lula quanto Bolsonaro em seu discurso.
Pelo menos dois candidatos enfrentaram resistência dentro de seus próprios partidos. A ala do Pros a favor de uma aliança com o PT, após reassumir judicialmente o comando da legenda, anunciou apoio a Lula. Mas, numa reviravolta na Justiça, a presidência do partido mudou de mãos novamente. E o coach Pablo Marçal foi confirmado como candidato ao Planalto. Nesta sexta, porém, uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do TSE, reconduziu o comando da legenda á ala que apoia Lula.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) também passou por divergências dentro de seu próprio partido. Uma ala que queria apoiar Lula chegou a entrar na Justiça para barrar a convenção. Mas não obteve sucesso, e Tebet foi oficializada como candidata. Isso evidenciou que a emedebista não tem o apoio integral de sua sigla, sobretudo dos diretórios do Nordeste.
Além disso, ela esperou para escolher um companheiro de chapa. A ideia original era de que fosse Tasso Jereissatti (PSDB-CE). Mas a vice ficou com a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP). Uma chapa só de mulheres deve ser um trunfo na campanha para conquistar o eleitorado feminino.
O deputado federal Hildo Rocha (MDB-MA), primeiro-vice-líder do partido na Câmara, admite que os discursos e as articulações de Bolsonaro e Lula com os partidos de centro provocam um isolamento da terceira via.
Apoiador da candidatura de Tebet, Rocha avalia que o atual cenário favorece o tensionamento entre Lula e Bolsonaro e, consequentemente, enfraquece as demais campanhas. “Eles tentam polarizar para eliminar a terceira via. A turma do Lula acha mais fácil derrotar Bolsonaro e a turma do Bolsonaro acha que tem discurso mais fácil para derrotar Lula. É uma polarização que se fortalece cada vez mais”, diz.
Polarização não tem mais volta, dizem cientistas políticos
Cientistas políticos ouvidos pela Gazeta do Povo afirmam que, com o centro político pulverizado, como mostraram as convenções, dificilmente Bolsonaro e Lula terão suas candidaturas ameaçadas.
“Vamos ter muitos candidatos. Alguns até serão bem votados, como Ciro Gomes e Simone Tebet. Mas não existe terceira via”, diz o sociólogo Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Segundo ele, a fragmentação das candidaturas de centro favorece, naturalmente, Bolsonaro e Lula. O cientista político aposta que eles estarão no segundo turno. “A eleição está polarizada, e as convenções reforçaram isso.”
O cientista político Ricardo Sennes, fundador e sócio-diretor da consultoria Prospectiv, avalia que o período das convenções mostrou uma uma ligeira vantagem a Lula em relação a Bolsonaro. “Vejo um certo alinhamento na campanha do Lula em direção ao centro, na busca pelo eleitor indeciso. Na campanha de Bolsonaro, vejo uma divisão entre radicalizar e ir ao centro, como defendem lideranças do Centrão”, analisa.
“Esse certo alinhamento da cúpula de Lula e desalinhamento na cúpula de Bolsonaro pode favorecer Lula”, afirma Sennes. “O Lula parece que está gastando menos energia para sua base já garantida e está basicamente concentrando esforços no centro. Ele faz o esforço de ampliar a aliança mais ao centro.”