Duas vezes extinto, plano de previdência dos deputados continua vivo
O plano de previdência dos congressistas foi extinto em 1999
porque estava falido. Foi substituído por outro plano até o 2019, quando foi
tentada uma nova extinção, na Reforma da Previdência. No final daquele ano,
restavam 174 deputados filiados ao Plano de Seguridade Social dos Congressistas
(PSSC). Mas o plano sobrevive, hoje com 147 deputados. A reeleição de 95 desses
parlamentares mantém vivo o plano zumbi.
Quem não se reelegeu, encontra brechas para assegurar a
aposentadoria, como as averbações (aproveitamentos) de mandatos, quando o
parlamentar praticamente compra a sua aposentadoria. Mesmo quem não está no
mandato, mas exerceu mandatos anteriores, pode conseguir a sua aposentadoria. É
o caso do presidente Jair Bolsonaro, que já adquiriu o direito ao benefício. Cinco
deputados e três ex-deputados terão direito a aposentadoria pelas regras do
antigo Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC), que foi extinto em
1999. As pensões do IPC passaram a ser responsabilidade da União, ou seja, do
contribuinte.
Entre os filiados ao PSSC, 50 não conseguiram a reeleição para o cargo deputado federal ou fracassaram em disputas por uma vaga no Senado ou para governos estaduais. Houve também deputados federais que foram eleitos governador ou vice-governador. Todos deixarão o plano de previdência. Quem tiver cumprido as exigências como tempo de contribuição, número mínimos de mandatos e idade mínima terá direito à aposentadoria. Somente após a apresentação desses pedidos a Câmara terá condições de informar o número de novos benefícios.
Bolsonaro, Alckmin, Aécio…
Entre os deputados agraciados pelas normas do IPC estão dois
ex-presidentes da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG) e Arlindo Chinaglia (PT-SP),
ambos reeleitos. Completam o grupo Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo
Bolsonaro; José Rocha (União-BA) e Gonzaga Patriota (PSB-PE), que não se
reelegeu. O ex-deputado Jair Bolsonaro adquiriu o direito à aposentadoria pelo
IPC com pensão de R$ 30 mil. Ele averbou dois anos do mandato de vereador. Os
ex-deputados Geraldo Alckmin (PSDB-SP), hoje vice-presidente eleito da
República; Paulo Paim (PT-RS), atualmente senador; e o empresário Flávio Rocha
(PL-RN) também seguem as generosas normas do IPC.
O deputado Onyx Lorenzoni (PL-RS), ex-ministro do Trabalho,
Secretaria Geral da Presidência, Cidadania e Casa Civil no governo Bolsonaro,
perdeu a eleição para o governo do Rio Grande do Sul. Completou cinco mandatos
como deputado federal. Em agosto de 2017, ele pagou R$ 14,8 mil pela averbação
de dois meses de mandato de deputado federal em 2006. Não terá tempo de mandato
para se aposentar no próximo ano.
Pompeo de Mattos (PDT-RS) já exerceu cinco mandatos de
deputado federal e foi mais uma vez reeleito. É filiado ao PSSC desde fevereiro
de 2003. Ele conseguiu em 2019 a averbação não onerosa de 5.497 dias – ou 15
anos – pelo exercício dos mandatos de vereador e prefeito de Santo Augusto (RS)
e de deputado estadual de 1983 até dezembro de 1998. Assim, já conta com 35
anos de tempo de contribuição à Previdência.
Wolney Queiroz (PDT-PE) cumpriu cinco mandatos e meio como
deputado federal a partir de 1995. Filiou-se ao PSSC em dezembro de 2001. Em
2015, a Câmara aprovou a averbação onerosa de 48 meses pelo deputado,
correspondente ao exercício de mandato na casa de fevereiro de 1995 a janeiro
de 1999. Sim, os deputados podem pagar contribuições retroativas. Ele não foi
reeleito em 2022.
Walter Alves (MDB-RN) está no segundo mandato de deputado federal. Filiou-se ao PSSC assim que tomou posse, em fevereiro de 2015. Filho do ex-senador Garibaldi Alves (MDB), foi eleito vice-governador do Rio Grande do Norte nas eleições deste ano. Em 4 de novembro, a Câmara aprovou a averbação onerosa, pelo deputado, de 2.922 dias de exercício de mandato de deputado estadual, de fevereiro de 2007 a janeiro de 2015. O valor da averbação será de R$ 1 milhão.
Aposentadorias proporcionais
Os registros de deputados aposentados também mostram a
prática da averbação de mandatos. Raimundo Gomes de Matos (PSDB-CE) exerceu
cinco mandatos e meio de deputado federal, completando 22 anos na casa. Em
janeiro de 2019, último ano de mandato, ele teve aprovada a averbação não
onerosa de 7.091 dias – ou 19,4 anos – de contribuição vertidos ao INSS, de
março de 1977 a julho de 1996. Ele está aposentado desde fevereiro de fevereiro
de 2019, com pensão de R$ 29.904.
Ênio Bacci (PDT-RS) exerceu cinco mandatos de deputado
federal, de 1995 a 2015. Em novembro de 2014, a Câmara aprovou a averbação
onerosa, pelo deputado, de 334 dias de mandato de vereador na Câmara Municipal
de Lajeado (RS), já fevereiro a dezembro de 1994. A averbação teve o valor de
R$ 65 mil. Ele é aposentado desde junho de 2019 com pensão de R$ 21,2 mil.
Carlos Souza (PSDB-AM) exerceu três mandatos de deputado federal, a partir de 2003, mais um ano como suplente. Para assegurar o tempo mínimo de contribuição, ele conseguiu a averbação não onerosa de 9.037 dias – ou 25 anos – , referentes ao tempo de contribuição vertidos ao Governo do Amazonas, no período de agosto de 1982 a setembro de 2001; ao INSS, de março de 1976 a agosto de 1982; e ao Exército Brasileiro, de maio de 1971 a março de 1972. Ele recebe aposentadoria de R$ 10,6 mil desde junho de 2018.
O que diz a nova regra
O ex-deputado Luiz Carlos do Chapéu (PR-RJ) aposentou-se em
14 de fevereiro de 2019, após cumprir apenas um mandato na Câmara. O ato
ocorreu dois dias antes da apresentação da Reforma da Previdência, que prometia
acabar com esse tipo de privilégio. Para completar o mínimo de dois mandatos
exigidos, ele aproveitou o período de quatro anos como vereador no Rio de
Janeiro, mais 27 anos de contribuição ao INSS.
O artigo 14 de Reforma da Previdência vedava a adesão de
novos segurados e a criação de novos planos dessa natureza. Mas algumas brechas
estenderam a vida do PSSC. Primeiro, os segurados de regime de previdência de
titulares de mandato eletivo tiveram prazo de 180 dias se retirar desses
planos. Arquivos da Câmara mostram que 32 deputados haviam aderido ao plano em
2019.
O parágrafo primeiro desse artigo estabelece que “os segurados atuais e anteriores”, do regime de previdência vigente, o PSSC, poderiam optar pela permanência nesse regime previdenciário. Para isso, cumpririam pedágio – período adicional – de 30% do tempo de contribuição que faltasse para aquisição do direito à aposentadoria. E se aposentariam aos 62 anos, se mulher, e 65 anos, se homem. A palavra “anteriores” assegurou que ex-deputados que exerceram mandatos em anos anteriores pudessem permanecer no plano.