CPI para investigar STF e TSE aguarda decisão de Arthur Lira
Com o apoio de 181 deputados federais, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que pretende investigar abusos cometidos por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) depende da autorização do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para ser instalada ainda neste ano.
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Após protocolar o pedido da CPI, nesta quinta-feira (23), o deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) informou que conversou com o presidente Lira. “Conversei à tarde com o presidente @ArthurLira_ para informá-lo do protocolo da CPI. Ciente e prestes a viajar em missão internacional, combinou de tratarmos do tema no seu retorno à Câmara, na próxima terça-feira (29)”, escreveu.
Van Hattem ressaltou em uma live, nesta sexta-feira (25), que o pedido da CPI seguiu todos os requisitos necessários para a instalação, como o número mínimo de assinaturas, prazo e fato determinados. Segundo o deputado, notícias de que a comissão não será instalada são apenas “especulações de quem torce contra a investigação”.
“Quanto a questões regimentais, a CPI pode ser instalada imediatamente, pode funcionar até o início do recesso parlamentar e pode ser prorrogada e entrar até o final de janeiro. E em virtude dos abusos que têm sido cometidos reiteradamente, e que podem ainda ser cometidos, é fundamental que ela comece imediatamente”, destacou o deputado.
Segundo alguns parlamentares ouvidos pela Gazeta do Povo, a proximidade do recesso parlamentar, que começa em 22 de dezembro, além da transição de troca de governo e a votação da Lei Orçamentária Anual não favorecem o cenário para a instalação da CPI do Abuso de Autoridade. Também constam outros 14 pedidos de instalação de CPI na Câmara dos Deputados, aguardando a deliberação do presidente Arthur Lira.
“A instalação, depende do Presidente da Casa, mas é de extrema necessidade e urgência que aconteça para investigação das arbitrariedades cometidas por alguns membros do TSE e do STF”, declarou a deputada Chris Tonietto (PL-RJ), uma das signatárias do pedido.
O deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), que também assinou o pedido, considera a CPI “necessária”. Porém, ele avalia que dificilmente será instalada neste ano. “Há uma previsão de apenas mais três semanas de reuniões e sessões deliberativas na Câmara dos Deputados até o fim desta legislatura. Ao término de cada legislatura, encerram-se os trabalhos e atividades nas comissões. Provavelmente, um novo requerimento terá que ser apresentado no próximo ano para a criação da CPI”, declarou.
A assessoria do presidente Lira disse à Gazeta do Povo que ele não irá se manifestar sobre o pedido da CPI. Na coluna do Guilherme Amado, Lira disse em conversa com interlocutores que não irá instalar a CPI, porque há uma fila de outros pedidos – cerca de outros 14 pedidos de instalação. “Lira considera que o STF e o TSE estão errando na dose de resposta ao bolsonarismo, mas não tem certeza se a CPI é o melhor instrumento para fazer os ministros mudarem de postura”, escreveu o colunista.
Pedido da CPI
O pedido da chamada CPI do Abuso de Autoridade, protocolado pelo deputado Marcel van Hatten, menciona a necessidade de investigar “a violação de direitos e garantias fundamentais, a prática de condutas arbitrárias sem a observância do devido processo legal, inclusive a adoção de censura e atos de abuso de autoridade por alguns membros do TSE e STF”.
Entre os casos a serem analisados estão: a decisão de busca e apreensão contra empresários por terem compartilhado mensagens em aplicativo; a determinação de bloqueio das contas bancárias de 43 pessoas e empresas suspeitas de financiarem atos antidemocráticos; a censura a parlamentares, ao economista Marcos Cintra, à produtora Brasil Paralelo, à emissora Jovem Pan e a tuíte do jornal Gazeta do Povo.
“É urgente que a Câmara dos Deputados, autêntica representante do povo brasileiro, exerça suas competências constitucionais para fazer cessar todo e qualquer autoritarismo advindo do Poder Judiciário, que vem ferindo de morte o Estado de Direito e instalando no país um verdadeiro Estado de Exceção, violando direitos constitucionais e garantias fundamentais”, escreveu Van Hattem.
Os 181 deputados federais que assinaram o pedido são de partidos com viés ideológico bastante diferenciado. Aparecem na lista parlamentares do Podemos, MDB, Cidadania, PSDB, Republicanos, PSC, PP, Patriota, PSDB e Novo.
Alguns parlamentares contrários à CPI se posicionaram nas redes sociais sobre o motivo pelo qual não assinaram. Um deles foi o deputado federal Fábio Trad (PSD-MS), relator da prisão em segunda instância (PEC 199/19). “Não assinarei a tal ‘CPI do abuso de poder do TSE e STF’ porque o abuso de poder parte justamente daqueles que se utilizam do mandato para enfraquecer o único Poder que está tendo coragem de combater o golpismo e a escalada da extrema direita no país. Não assino. Viva o TSE!”, escreveu Trad.
Diante dos críticos à CPI, Van Hattem ressaltou que a instalação da comissão é uma forma de “pacificar o país e fazer com que haja um reequilíbrio institucional”. “Não queremos um poder acima do outro, não é nada contra o poder, é tudo a favor do legislativo, da independência e da harmonia entre os três poderes”, disse.
Deputado entra com ação no STF contra CPI
Após o deputado Marcel van Hattem conseguir o número mínimo de assinaturas para a instalação da CPI do Abuso de Autoridade, o deputado Nereu Crispim (PSD-RS) entrou com uma ação no STF contra a tramitação da comissão que pretende investigar a própria suprema corte. Na petição, além de pedir que a CPI seja arquivada, o deputado Crispim solicita o pedido seja investigado no inquérito que apura a atuação das milícias digitais.
Segundo o parlamentar, a criação da CPI seria inconstitucional e ilegal por violar cláusulas pétreas da Constituição, atentando contra a separação de Poderes, e afirma que a iniciativa de Marcel van Hattem (Novo-RS) teria como objetivo legitimar e incentivar os “atos antidemocráticos”.
Apesar de Van Hattem não questionar o resultado das eleições e tampouco citar os atos realizados em frente a quartéis, Nereu Crispim vê no pedido de CPI uma forma de incitar esses protestos. “Dentre tantos baderneiros e insatisfeitos com o resultado (das eleições), comunico notícia da ocorrência de crime, em tese, praticado pelo deputado federal Marcel van Hattem que se utilizando do cargo e de instrumentos legislativos e de suas redes sociais, comete atos de incitamento a animosidade entre as Forças Armadas e os poderes constitucionais e outras instituições que tomaram decisões para garantir a lei e a ordem durante e após as eleições”, diz trecho do pedido de Crispim.
Procurado pela Gazeta do Povo, a assessoria do deputado Van Hattem disse que essa ação “nem merece resposta”.
Decisões do STF e do TSE são questionadas por juristas
No período da campanha eleitoral e depois das eleições, o TSE, presidido pelo ministro Alexandre de Moraes, determinou a censura prévia de conteúdos e o bloqueio de perfis nas redes sociais. Nas últimas semanas, qualquer pedido de esclarecimento sobre urnas eletrônicos foi punido pelo tribunal com multas ou outras medidas que fogem ao previsto na legislação brasileira.
Desde a instalação do inquérito das fake news, em março de 2019, o STF e, mais recentemente, o TSE têm adotado medidas consideradas inconstitucionais por diversos juristas. O STF iniciou, por exemplo, diversos inquéritos de ofício (sem ser provocado e sem reconhecer as prerrogativas do Ministério Público), utilizando de forma anômala o artigo 43 do regimento da Casa, tornando-se assim juiz, acusador e vítima em vários processos – o que fere o devido processo legal e o amplo direito de defesa.
Dentre os deputados federais com mandato ativo que tiveram perfis suspensos por ordem do TSE estão Carla Zambelli (PL-SP), Major Vitor Hugo (PL-GO), Coronel Tadeu (PL-SP) e José Medeiros (PL-MT). Já entre candidatos que saíram vitoriosos nas urnas neste ano e assumirão mandato na Câmara no próximo ano e que também foram censurados estão Gustavo Gayer (PL-GO) e Nikolas Ferreira (PL-MG), que teve a maior votação do país nas eleições deste ano. Há, ainda, uma série de perfis censurados, como de jornalistas, empresários e artistas.