Campanha de Bolsonaro tenta evitar disputas no PL por verba eleitoral
A possibilidade de que o presidente Jair Bolsonaro (PL) consiga doações eleitorais de pessoas físicas, permitidas pela lei eleitoral, é uma das estratégias do partido para evitar disputas internas por verbas eleitorais. No mês passado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definiu o valor que o PL vai ter para financiar todos os seus candidatos por meio do fundo eleitoral: R$ 288,5 milhões. Lideranças da legenda avaliam que, sem recursos privados para a reeleição de Bolsonaro, o dinheiro do “fundão” será curto para os candidatos do PL em todo o país.
A maioria das lideranças do partido ouvidas pela Gazeta do Povo nega que essa situação possa causar um racha no partido. Mas o fato é que a sigla “inchou” com os aliados do presidente que estavam no PSL e mudaram para o PL na janela partidária do começo deste ano. Mas não houve crescimento na verba pública a que a sigla terá direito na eleição, o que significa que haverá mais candidatos para dividir a mesma quantia.
O PL hoje tem a maior bancada da Câmara dos Deputados, com 77 parlamentares. Esse é o critério para dividir o dinheiro do fundo: quanto maior a bancada de deputados do partido, maior a verba eleitoral. Mas a divisão do dinheiro é feita com base nos deputados eleitos em 2018. E, por isso, o PL tem apenas a sétima maior fatia entre os partidos – cota que foi conquistada pelos 37 deputados que não eram do PSL e que se elegeram há quatro anos. Por outro lado, a presença de Bolsonaro no partido tende a aumentar o voto de legenda no PL, o que pode beneficiar os integrantes mais antigos do partido.
A coordenação da campanha de Bolsonaro não tem uma projeção mínima ou máxima de recursos a serem arrecadados por meio de doações. Há a expectativa, porém, de que o dinheiro doado por pessoas físicas seja suficiente para financiar toda a campanha presidencial.
Não há limite de quantia a ser recebida por intermédio do financiamento de pessoas, desde que os gastos não ultrapassem o teto de R$ 132,5 milhões definido pelo TSE, no último dia 30, para a campanha presidencial. São R$ 88,3 milhões de limite para gastos no primeiro turno por candidato e mais R$ 44,2 milhões para cada um que for ao segundo turno.
Com isso, na hipótese de a campanha de Bolsonaro gastar o teto de R$ 132,5 milhões e não ter financiamento próprio, sobrariam cerca de R$ 156 milhões a serem distribuídos aos candidatos do PL em todo o país. O partido planeja eleger pelo menos 70 deputados federais em outubro. Fora os pré-candidatos a deputados estaduais, também há a expectativa de lançar pré-candidaturas ao Senado nos 26 estados e no Distrito Federal, e aos governos de 11 estados.
A fim de evitar impactos a aliados e impulsionar a arrecadação de recursos para Bolsonaro, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, e o líder do partido no Senado, Flávio Bolsonaro (RJ), preparam o lançamento de um site que contenha todas as informações necessárias para orientar os eleitores que queiram financiar a campanha presidencial.
Doações à campanha de Bolsonaro ajudam, mas apenas mitigam impacto
O incentivo às doações para a campanha de Bolsonaro pode aliviar as contas do PL, mas tem o potencial de apenas mitigar a necessidade de recursos para a ambição da legenda em eleger o máximo de deputados federais, senadores e governadores. Mesmo que Bolsonaro consiga se autofinanciar com recursos privados, o dinheiro do fundo eleitoral ainda seria insuficiente para as pretensões do partido.
“Se não tiver uma arrecadação excedente, aí vai ter que dar um pouco para cada um. Vai ser cota mínima, não cota máxima. E o PL sempre deu cota máxima para os deputados federais”, diz um dirigente de diretório estadual da sigla. Em 2018, o teto de gastos definido pelo TSE para deputados federais foi de R$ 2,5 milhões. Neste ano, o limite subiu para R$ 3,1 milhões.
Na hipótese de o PL conceder a cota máxima de R$ 3,1 milhões para cada um dos 77 deputados federais, seriam necessários R$ 238,7 milhões. “Se entregam a cota máxima para os deputados, já não teria como conceder uns R$ 3 milhões para cada campanha ao Senado. Nem teria dinheiro para as campanhas aos governos nos 11 estados e para deputados estaduais”, diz o dirigente.
O vice-presidente nacional do PL, deputado federal Capitão Augusto (SP), acredita que, de maneira geral, ninguém vai gastar o teto do que for disponibilizado pela incerteza em relação ao dinheiro para as campanhas, principalmente a deputado federal, onde não é possível fechar coligações. “Então, todos os candidatos têm que lançar chapa completa. Em São Paulo, teremos mais de 2 mil candidatos para deputado estadual e federal. Um teto de gastos para deputado federal a R$ 3,1 milhões não dá para distribuir para todo mundo”, diz.
Justamente em decorrência dos recursos escassos, Augusto defende para cargos majoritários estaduais a distribuição com base em pesquisas eleitorais. “Tem que acompanhar as pesquisas para ver como está. O PL não vai jogar um caminhão de dinheiro em candidato que não tem chance alguma. Por outro lado, não vai deixar sem ‘pão e água’ um candidato que tem tudo para se eleger governador ou senador. Vários partidos levam isso em consideração, coisa que não dá para fazer agora”, diz.
Ele esclarece que essa é uma análise pessoal e que o partido discutirá os critérios no período das convenções partidárias, que vai de 20 de julho até 5 de agosto.
Tais cálculos reforçam a análise de que não pode ser descartada a hipótese de a cúpula do PL distribuir uma cota mínima do fundo entre todos os pré-candidatos, inclusive os postulantes à Câmara. Há uma confiança entre alguns, porém, de que a campanha de Bolsonaro possa arrecadar mais recursos do que o necessário para financiar sua candidatura. Outros ponderam que ele possa não atingir o teto previsto para o posto.
A resolução do TSE que regulamenta a arrecadação e os gastos de campanha permite que o partido possa transferir recursos que tenham sido doados para seus candidatos, desde que feitos por eleitores, ou seja, pessoas físicas, não por empresas. Pela perspectiva de possível distribuição de recursos excedentes aos necessários para a campanha de Bolsonaro, o PL analisa se concentra os recursos doados em uma conta vinculada à legenda ou se abre uma conta específica para o financiamento coletivo específico da campanha.
O compromisso do partido com os recursos oriundos de doações, porém, é financiar a campanha de Bolsonaro. “O valor é para fazer a campanha presidencial e, também, para ter dinheiro para as candidaturas de deputados, senadores e governadores”, diz um interlocutor da coordenação política.
A ideia é assegurar que a legenda possa eleger o maior número possível de candidatos. “A meta é tentar atender a todo mundo da melhor maneira possível até para poder ajudar o máximo de parlamentares. Tem que fazer uma bancada grande no Senado e na Câmara, além de muitos governadores. E, para isso, todos precisam de recursos para alcançar essas vitórias”, sustenta o interlocutor.
Quais as chances de não haver disputa interna por verbas do fundo eleitoral
Apesar de os cálculos evidenciarem as dificuldades do PL em distribuir os recursos do fundo eleitoral pela cota máxima, deputados avaliam que as incertezas sobre o financiamento de campanhas do partido não vão gerar disputas internas na legenda. Nos bastidores, é dito que apenas uma minoria questiona a divisão de recursos, seus critérios e se ela será mais justa com os deputados federais que já eram da legenda antes da filiação de Bolsonaro.
Capitão Augusto é um dos que não acredita que a distribuição de recursos possa gerar ruídos ou desavenças internas. “Queremos eleger todos que vieram para cá e até aumentar um pouco. A gente respeita a decisão do Valdemar Costa Neto. Ele que decide e a gente respeita. Nunca teve problema e é natural que um candidato possa receber mais do que o outro. É natural que quem está no mandato tenha preferência pouco maior de quem sai candidato pela primeira vez. É uma coisa feita com muita naturalidade, tudo muito bem combinado”, diz o vice-presidente do PL.
Outro parlamentar endossa o vice-presidente do partido e aponta que esse debate não gerou “estresse” no PL. “Estão todos cientes. Todos que migraram na janela partidária têm noção que o fundo não vai dar para todos e vão ter que procurar recursos para eles também”, diz.
Outro parlamentar do partido tem visão semelhante. “Não existe divisão de quem estava antes e chegou depois. Acho que a direção do partido vai buscar dar maior competitividade para todos e vai avaliar o melhor critério, mas ainda nem chegou nesse ponto de discussão, porque existe a expectativa de arrecadar com doações”, afirma. Ele reconhece, porém, que as campanhas majoritárias não têm recursos suficientes e que isso pode ser uma preocupação maior.
Um deputado que já estava no PL antes da janela partidária e da filiação de Bolsonaro ao partido sugere que os parlamentares oriundos do PSL possam abdicar dos recursos do fundo eleitoral para buscar seus próprios meios de financiamentos de campanha. “A maioria deles sempre criticou o fundo e até votou contra o aumento [do valor da verba eleitoral para R$ 5,7 bilhões]”, diz.
Vaquinha é cogitada por ala ideológica do PL; vice alerta para riscos
Um dos deputados que migrou na janela partidária para o PL diz que não pretende financiar sua campanha com recursos do fundo e que nem sequer negociou com Costa Neto a obtenção de verbas eleitorais. A meta do parlamentar é financiar sua campanha com uma “vaquinha”. “Eu nunca contei com ninguém para esse tipo de coisa. Estou acostumado a me virar”, diz.
A maioria dos deputados que eram do PSL ouvidos pela reportagem afirma que irá financiar sua campanha com vaquinha própria.
É o caso da deputada Carla Zambelli (PL-SP), que anunciou no mês passado, em suas redes sociais, o lançamento de seu financiamento coletivo. A parlamentar disse que não usará o fundo eleitoral a despeito de muitos de seus eleitores, segundo ela, terem comentado que ela deveria usar a verba pública, “buscando paridade de armas” com outros candidatos. Outros deputados federais já lançaram ou vão lançar suas vaquinhas, a exemplo de Sanderson (PL-RS), vice-líder do governo na Câmara.
O deputado Capitão Augusto, porém, vê as vaquinhas com cautela. Para ele, elas podem ser um “tiro no pé”. “A vaquinha é pública. Todos acompanham os valores. Se faz uma vaquinha e a arrecadação é pífia, já te rotulam como perdedor, derrotado. E começa a pecha de que não tem apoio, que é [um candidato] fraco”, adverte. “Conversei com vários deputados e o pessoal está com receio de fazer a vaquinha, não arrecadar nada e já começar a campanha desacreditado pela oposição e por adversários. E aí, ninguém apoia. É complicado”, afirma o vice-presidente do PL.
Como a coordenação de Bolsonaro tenta arrecadar e quem pode doar
O senador Flávio Bolsonaro e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que integram a coordenação eleitoral do presidente da República, articulam o “grosso” das doações à campanha de Jair Bolsonaro junto a grandes empresários. Há conversas com empresários da agropecuária, do varejo e da indústria farmacêutica, por exemplo.
Em maio, Costa Neto e o presidente Bolsonaro compareceram a um almoço na casa do empresário Fernando Marques, dono da União Química. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o convite partiu de Maurício Tonhá, dono da leiloeira de gado Estância Bahia. O evento foi organizado com o propósito de atrair doadores dispostos a financiar a candidatura à reeleição.
A ideia da coordenação, porém, é que qualquer eleitor possa doar. Por isso, a ideia é estimular a doação de pessoas físicas por meio de transferências pelo Pix. As transações por meio dessa modalidade serão permitidas apenas na modalidade de chave pelo CPF, a fim de garantir a identificação e a rastreabilidade das movimentações financeiras.
As doações pelo Pix podem ser feitas de um valor de até R$ 1.064,10. Já as doações de valores iguais ou superiores somente podem ser feitas mediante transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal. Essa regra deve ser observada, inclusive, na hipótese de contribuições sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia, alerta o TSE.
Além disso, eleitores podem doar no máximo 10% de seus rendimentos brutos no ano anterior à eleição. Além da doação de dinheiro, pessoas físicas também podem doar ou emprestar bens pessoais estimáveis em dinheiro diretamente aos candidatos.
Desde 2018, o limite do valor das doações de bens pessoais é R$ 40 mil por pessoa física. Caso o teto não seja respeitado, o doador tem que pagar uma multa no valor de 100% da quantia em excesso.