O que Bolsonaro fará agora que TSE rejeitou denúncia sobre inserções
Apesar de não haver consenso entre os estrategistas, a campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) tentará associar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a um suposto favorecimento ao PT e à candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva após a Corte rejeitar a denúncia de desequilíbrio em inserções de rádio a favor do petista.
Em comício em Minas Gerais, nesta quarta-feira (26), Bolsonaro sugeriu a possibilidade de tentativa de manipulação do resultado das eleições. Disse que as suspeitas teriam “o dedo” do PT e que o partido, juntamente com o TSE, teria “muito o que explicar nesse caso”. À noite, em declaração à imprensa no Palácio da Alvorada, voltou a fazer essa associação após o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, negar prosseguimento à queixa apresentada pela campanha à reeleição.
“Está comprovado a diferenciação e o tratamento dispensado ao outro candidato [Lula], que poderia — não posso afirmar — até ter participação dele em algum momento. Se o TSE não tinha nada a ver com isso, é incompreensível a demissão sumária desse servidor e da forma como foi conduzido para fora do TSE”, declarou Bolsonaro sobre a exoneração do servidor Alexandre Gomes Machado, que era responsável no tribunal em disponibilizar as inserções da propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
O presidente também afirmou que a campanha vai contratar uma terceira auditoria a fim de respaldar a denúncia apresentada ao TSE e disse que a coordenação jurídica deve recorrer da decisão do ministro Alexandre de Moraes.
A despeito das declarações de Bolsonaro, a própria campanha se divide sobre o tema. Uma ala entende que é importante confrontar o TSE a fim de alertar e engajar os eleitores nesta reta final do segundo turno, sobretudo o eleitorado mais “raiz” do presidente. A percepção de outro grupo é de que as suspeitas têm pouco potencial de conversão de votos e de ampliação da base eleitoral, e que o mais prudente é manter a sustentação da denúncia e contestar nos tribunais cabíveis decisões adversas ao caso, mas evitar uma associação direta entre Lula, PT e TSE.
Os estrategistas que entendem que a campanha deve se distanciar dos holofotes defendem uma atuação mais estratégica nos bastidores. Não à toa, os coordenadores eleitorais deram aval e incentivaram congressistas da base a adotarem movimentos políticos para pedir a investigação das suspeitas e associar um suposto favorecimento do TSE à candidatura petista.
Como coordenadores da campanha reagiram ao desequilíbrio nas inserções
A campanha de Jair Bolsonaro adotou uma postura mais pragmática em relação às suspeitas de discrepância entre as inserções veiculadas nas rádios. O coordenador de imprensa, Fábio Wajngarten, usou as redes sociais para dar mais detalhes do levantamento que embasa a denúncia. “As auditorias de mídia contratadas pela campanha são renomadas, certificadas e com alta tecnologia”, disse.
Wajngarten comentou as alegadas discrepâncias nas inserções de rádio em Minas Gerais. Segundo a auditoria, apenas entre 7 e 14 de outubro, 90% das rádios mineiras exibiram 15.101 inserções a mais para o PT. “É um escândalo sem precedentes!!!”, escreveu. À noite, em entrevista à Jovem Pan, assegurou que a campanha enviou inserções às rádios. “Temos todos os recibos”, disse.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, outro integrante do núcleo político da campanha, teve uma atuação mais discreta. Depois de publicar na terça-feira (25) um vídeo nas redes sociais afirmando que a campanha havia protocolado a petição junto ao TSE com a auditoria realizada, ele não voltou a tocar no caso nesta quarta. Limitou-se a comemorar as informações de geração de empregos em setembro, falar sobre a agenda eleitoral de Bolsonaro e a propaganda eleitoral veiculada na rede nacional de TV, além de destacar a promessa de aumento real do salário mínimo em 2023.
O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, foi outro a destacar a geração de empregos em setembro em comentário no Twitter. A abordagem de uma agenda propositiva é apontado como o mais estratégico no momento para virar votos e assegurar uma vitória. Boa parte dos coordenadores eleitorais esperam um desdobramento mais robusto para evitar acusações e incorrer em alguma irregularidade eleitoral que possa gerar prejuízos à campanha. “Até porque o TSE está com superpoderes”, comenta um interlocutor.
O coordenador-geral da campanha, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), se manifestou sobre diferentes temas, desde propostas em caso de reeleição, como o aumento do salário mínimo, ao tema das inserções nas rádios. “Bolsonaro levou uma segunda facada. Vamos vencer as eleições, apesar da tentativa de manipulação do resultado”, declarou.
Como a base política pode ajudar a campanha no caso das inserções
A articulação da campanha junto à base política para associar as denúncias entre Lula e TSE é algo que interlocutores apontam que deve ganhar mais força até as eleições. Os requerimentos de deputados federais para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e de uma comissão externa para acompanhar os desdobramentos do caso são ambos movimentos que tiveram o aval e a anuência da campanha nos bastidores.
Entende-se que a estratégia política junto à base não tem potencial para desgastar a campanha como as acusações diretas feitas pelo próprio Bolsonaro. A expectativa é que os parlamentares aliados ajudem a construir um movimento de engajamento da militância nas redes sociais sem as digitais do próprio presidente ou de coordenadores eleitorais.
Entre os requerimentos que tendem a ganhar mais força é de uma comissão externa da Câmara. Por não envolver despesas orçamentárias da Casa, o regimento interno possibilita que o colegiado possa ser criado apenas pelo aval e a autorização do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Já uma CPI demandaria 171 assinaturas e, em uma semana sem sessões do Congresso, essa seria uma tarefa mais desafiadora.
O deputado federal Vitor Hugo (PL-GO) defende os movimentos da base aliada e entende que a denúncia apresentada pela campanha é “gravíssima”. “São mais de 1.280 horas de exposição nas rádios a menos para a campanha do presidente. Isso é uma desigualdade e desequilíbrio que a Justiça Eleitoral precisa dar uma resposta que possibilite o reequilíbrio da paridade de armas entre os candidatos”, argumenta.
Outra estratégia adotada por aliados é o de pedir proteção à segurança e integridade do servidor exonerado do TSE. A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) fez o pedido à Polícia Federal (PF). O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) foi outro a adotar movimento semelhante, ao oficiar o Ministério da Justiça para requerer a proteção ao servidor que prestou depoimento à PF.
“Acho que vai ser inevitável aprofundar nessa investigação e entender por que isso acontece, por que o TSE tem tanta sede para monitorar rede social, censurar emissoras, jornalistas, perfis, mas não controla propagandas que a gente paga e está dando esse disparate todo que saiu na mídia”, opina.
Girão diz, ainda, que tem pedido e conversado com senadores para articular medidas relacionadas ao caso. “O Senado está paralisado, não está mais nem de joelho. Está quase no chão porque fica assistindo a isso tudo, os sucessivos abusos que vêm dos nossos tribunais superiores”, afirma. Ele é autor de um requerimento para fazer um voto de repúdio a censuras do TSE a veículos de imprensa. O requerimento foi assinado por 23 senadores, mas ainda precisa de mais quatro assinaturas.
O cientista político Lucas Fernandes, coordenador de análise política da BMJ Consultores Associados, entende que é coerente a campanha e a base política coordenarem ações que visam criar associações entre Lula e o TSE. Mas pondera que os efeitos disso apenas geram “cortina de fumaça” política.
“É o que sobrou. É melhor fazer barulho com isso do que deixar o noticiário repercutir o aumento da gasolina e do diesel, falar sobre Roberto Jefferson. É um caso que corrobora muito a narrativa de Bolsonaro de que o Judiciário supostamente tem um lado e que está ali consistentemente favorecendo o Lula”, diz.
Indiretamente, Fernandes entende que pode haver algum benefício à campanha, mas mínimo. “Dá um tema quente para ele abordar na eleição e, de quebra, pega um ou outro eleitor indeciso que veja o caso e avalie como um grande complô contra o Bolsonaro, mas que atinge um impacto e nicho pequeno do eleitorado”, diz.